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Artigo Segunda-feira, 25 de Julho de 2016, 00:00 - A | A

25 de Julho de 2016, 00h:00 - A | A

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Os cinturões do governo Temer



Gaudêncio Torquato

 

O desempenho de uma administração é geralmente avaliado pela somatória de quatro cinturões: o econômico, o político, o social e o de gestão administrativa. O equilíbrio entre eles é responsável pela fortaleza ou fragilidade das ações programáticas. Os campos se imbricam de forma que o sucesso alcançado num afeta positivamente o outro.

A recíproca é verdadeira. Tomemos o caso da economia: se gerar resultados de forma a resgatar a confiança dos setores produtivos, a frente política tende a olhar de maneira simpática para a gestão, com a consequente aprovação de projetos do Executivo. A área social, por sua vez, repousará sobre um colchão de harmonia e segurança se o bolso dos consumidores ganhar recursos para enfrentar as demandas cotidianas. Portanto, a economia é a locomotiva que puxa outros vagões do trem.

Sob a viabilidade econômica, a administração terá capacidade de usar o poder como ‘capacidade de fazer com que as coisas aconteçam’, como ensina Bertrand Russel. Analisemos, então, os cinturões do governo Temer. O cinto econômico (a ideia de cinturão se conecta à possibilidade de aperto ou afrouxamento dos instrumentos usados na economia) está sendo implantado por uma equipe de reconhecida competência, chefiada pelo ministro Henrique Meirelles.

Os primeiros trilhos para fazer correr a locomotiva foram bem recebidos pelo mercado, a partir das propostas para limitar as contas públicas, reduzir a máquina administrativa, estabelecer critérios de mérito na ocupação de cargos em empresas públicas e no esforço para renegociar as dívidas dos Estados.


O alinhamento dos trilhos implica rigidez nas contas públicas, razão pela qual o governo concentra esforços para estreitar o déficit fiscal de 2017 para R$ 139 bilhões, inferior aos R$ 170 bilhões previstos para esse ano. De onde o governo vai arrumar recursos para tapar o gigantesco buraco? Promete Meirelles: cortando despesas; promovendo a desestatização de espaços como os aeroportos de Congonhas e Santos Dumont; repatriando recursos e até, se for caso, aumentando contribuições, como a Cide.

O maior gargalo da administração, a Reforma da Previdência, certamente está no foco do novo governo e sua equação passa pelo ajuste (consensuado) entre tempo de aposentadoria (homens e mulheres) e tempo de contribuição. O fato é que o sucesso dessas iniciativas implicará fôlego na frente política e animação no corpo social. E por que, em tempos de contenção, o governo abre o cofre para conceder aumentos ao funcionalismo e ao Judiciário, além de aumentar em 12% o programa Bolsa Família?

Ora, o governo procura ajustar o cinturão social, na medida em que a injeção de recursos no bolso das margens e da massa funcional garante harmonia e menos tensão, com a contenção de previsíveis greves de servidores. Portanto, a lógica da gestão Temer parece ser esta: um olho nas contas públicas, outro na harmonia social, passando por eventuais agrados para acalmar atores políticos nas duas casas congressuais. Para que o pacote de programas atravesse os corredores das duas Câmaras, faz-se necessária articulação ajustada às demandas parlamentares.

O perigo reside na perda de noção sobre o que é essencial e o que é perfunctório. Essa ameaça sempre existe, principalmente quando os atores políticos - partidos, grupos, operadores de estruturas - disputam espaços de poder e expandem a dissonância interna. Quando isso ocorre, a desorganização governamental chega ao auge.

Foi, aliás, o que ocorreu nos últimos meses do governo Dilma. Daí a necessidade de o governo Temer encontrar um vértice e uma identidade.

Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato
 

 

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