DIRLEY FERNANDES
Na sexta-feira, quando teve início o calendário de pagamentos do Bolsa Família, o governo federal anunciou que havia “zerado” a fila do programa “pela terceira vez no ano”, após a entrada de 755 mil novas famílias. Enquanto isso, mulheres que tiveram os benefícios cancelados no mês anterior tentavam descobrir o que tinha acontecido e lotavam as redes sociais do programa. Em julho, esses cancelamentos atingiram o recorde de 543 mil. Com isso, entre julho de 2016 e o mesmo mês de 2017, o total de beneficiários do programa foi reduzido em 1,16 milhão de famílias, após um “pente-fino” anunciado pelo governo federal para punir eventuais abusos no recebimento do benefício. Com o afrouxamento da meta fiscal anunciado pelo governo na semana passada, houve uma recomposição. Ainda assim, entre agosto do ano passado e agosto desse ano, o número de beneficiadas pelo programa teve uma redução de 352 mil famílias.
Com o pente-fino, conseguimos afastar as pessoas que tinham renda maior e repassar o benefício para quem mais precisa. As famílias que estão entrando agora vão receber o Bolsa enquanto não tiverem uma fonte de sustento maior”, justifica, em nota, o ministro do Desenvolvimento Social, Osmar Terra.
A redução do número de famílias beneficiadas com o Bolsa Família vai de encontro a uma sugestão do Banco Mundial. Alarmado com os efeitos da crise econômica no Brasil, o órgão lançou em fevereiro um documento em que alertava que o país estava prestes a perder os ganhos sociais conquistados entre os anos de 2004 e 2014, quando, “em razão do rápido crescimento do emprego formal, maiores salários reais e programas redistributivos de assistência social como o Bolsa Família (…) mais de 28,6 milhões de pessoas saíram da pobreza”.
A entidade estima que entre 2,5 milhões e 3,6 milhões de brasileiros entrarão na pobreza este ano – o que significa que a renda deles regrediu para um patamar máximo de R$ 140.
A ampliação do benefício seria uma forma de atenuar o sofrimento desses ‘novos pobres’. O governo federal, no entanto, optou por reduzir o total de famílias atendidas. Como, em média, os beneficiários do Bolsa Família tem dois filhos, são 700 mil crianças a menos no programa.
“Nas duas crises anteriores, que não se revelaram tão fortes como a atual, no fim dos anos 1990 e, depois, em 2003, foram concebidos o Bolsa Escola (criado em 2001); e depois o Bolsa Família (2003). Momentos como esse são próprios para usar a estrutura que criamos, a plataforma do Bolsa Família, para fazer mais e não menos política social”, diz o pesquisador Marcelo Neri, ex-presidente do Ipea e ex-ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos. O economista calcula a entrada de 3,6 milhões de pessoas na pobreza apenas em 2015, quando a renda da população mais pobres caíu 14%. "De lá para cá, a situação piorou", garante.
Programa não prejudica ajuste
Economista-chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, Marcelo Neri frisa que investir no Bolsa Família combate a pobreza sem onerar as contas públicas e ainda têm efeito positivo na reativação da economia. “O programa custa 0,5% do PIB, contra 12% da Previdência”, diz ele, que é favorável, “em linhas gerais” à reforma previdenciária proposta pelo governo. “Já o Bolsa Família, definitivamente, não é o lugar para economia de recursos”.
Entre entradas e saídas no programa, o Estado do Rio foi um dos que mais saiu perdendo: em agosto de 2016, 811 mil famílias recebiam o Bolsa Família. Esse mês, serão 40 mil a menos, totalizando 771.323 famílias. Nesse período, considerando números do fim do 2º trimestre, a taxa de desemprego no estado subiu 42%, segundo o IBGE. Cerca de 400 mil moradores do RJ perderam emprego.
Na quarta-feira, o ministro do Desenvolvimento Social (MDS), Osmar Terra, esteve no Rio e disse que planeja dobrar o valor pago aos beneficiários do Bolsa Família no estado, como parte das intervenções de segurança em curso.
Em maio, Terra chegou a divulgar um reajuste geral dos benefícios em julho — e acima da inflação —, mas a área econômica do governo vetou o aumento.
Cumprir metas na educação não é prioridade
Com o ajuste das contas públicas no centro de todas as atenções do governo, outra área que sofre é a Educação.
Enquanto os reitores das universidades federais afirmam que os recursos previstos para este ano para as instituições não são suficientes nem mesmo para as despesas regulares com energia, vigilância, limpeza, bolsas para alunos de baixa renda e manutenção das instalações, o governo formalizou a importância menor para a área em sua agenda.