Reportagem
Mato Grosso do Norte
O clima na comunidade garimpeira do Juruena, em Nova Bandeirantes é de muita insegurança, mesmo com a decisão que suspendeu por 60 dias a desocupação do garimpo. O temor é que [caso não haja um acordo entre as partes envolvidas] a disputa pela área de garimpo evolua para conflito, violência e mortes.
Esta premissa é de uma fonte consultada por Mato Grosso do Norte, que trabalha na extração de outro na região impactada. Esta fonte, que pediu para não ter o nome revelado, reitera que há famílias de garimpeiros que moram na Vila do Juruena há décadas. E que dependem da atividade garimpeira para sobreviver.
A instabilidade começou com uma decisão da ANM- MT, que autorizou a mineradora estabelecer uma servidão publica de 2.386,97 hectares, o que facultou a mineradora Keystone Mineral Ltda obter uma decisão judicial favorável, que autorizava a empresa requerer força policial, para fazer a retirada dos garimpeiros, seus bens, e inclusive dar fim na vila, onde esta comunidade reside a cerca de 45 anos.
Isto apesar da existência de um acordo (Termo de Conciliação Nº 2/2023/SOD-ANM/DIRC), firmado em 25/04/2023, entre a Agência Nacional de Mineração (ANM - Nacional), Juruena Mineração & Keystone Mineração e a COOGAVEJA, com a METAMAT como interveniente.
A instabilidade começou com uma decisão da ANM- MT, que autorizou a mineradora estabelecer uma servidão publica de 2.386,97 hectares, o que facultou a mineradora Keystone Mineral Ltda obter uma decisão judicial favorável
Foto/ reprodução Keystone

No entanto, a Cooperativa dos Garimpeiros do Vale do Juruena, COOGAVEJA, acionou a justiça e conseguiu suspender o processo e execução da imissão na posse por um período de 30 dias, renovável por mais 30.O conflito serviu para mobilizar a comunidade garimpeira do Juruena. No dia 13 de março foi realizada uma grande reunião na Vila Juruena, com a participação de mais de 300 garimpeiros, representantes do poder Judiciário, empresários do setor de mineração e o prefeito de Nova Bandeirantes, Rogério de Souza. A lista de presença foi assinada por 333 pessoas.
Fato que corroborou, para que em 19/03/2025, o juiz proferisse sua decisão: “Declino a competência para uma das Varas de Direito Agrário”. Certamente por entender que o mérito de uma servidão é se apropriar de bens particulares, em benefício da coletividade. ou seja, ser de utilidade pública. O que certamente não seria o caso.
Prevalece ainda o temor, conforme esta fonte, que, no final, os garimpeiros, por força de outra decisão judicial equivocada, percam o direito de continuar na atividade e sejam retirados da área.
A expectativa é que haja uma solução definitiva para este conflito, e que seja respeitado o que foi acordado no Termo de Conciliação Nº 2/2023/SOD-ANM/DIRC. Sobretudo, no que diz respeito a área acordada para a mineradora desenvolver o seu projeto exploratório, que foi de 86,5 hectares.
A presidente da Coogaveja, Marion Schimaida Moraes, contatada por Mato Grosso do Norte, respondeu que somente a partir da próxima semana, irá falar sobre a questão. Mas adiantou que a COOGAVEJA está aberta para encontrar soluções que permitam ambos, garimpeiros e mineradora, trabalharem em harmonia.
Histórico – O garimpo Juruena é uma das lavras de mineração mais antigas de Mato Grosso, de acordo com geólogo Dr. Antonio João Barros, do Metamat (Companhia Mato – Grossense de Mineração), profundo conhecedor da história da mineração em Mato Grosso.
Fontes orais atestam que as primeiras descobertas de ouro na região, que hoje se insere o garimpo do Juruena, no município de Nova Bandeirantes, remontam ao ano de 1947, quando garimpeiros oriundos de Itaituba, Pará, chegaram ao local pelo rio Juruena.
Ele conta que a primeira ocorrência de ouro na região foi registrada no leito do córrego Arrasto. “Esse garimpo foi financiado por um explorador chamado Nilson Pinheiro, que, junto com o prospector Juvenal, promoveu a abertura da primeira pista de pouso para aeronaves, construiu casas e inaugurou o antigo cemitério da vila. Na década de 1960, Nilson vendeu o garimpo do Juruena para um senhor chamado Arquimedes”, pontua Dr. Antonio.
Segundo ele, durante o auge da corrida garimpeira, nos anos 1980, cerca de 20 mil garimpeiros atuaram na região, com uma produção estimada de 14 toneladas de ouro. Desde então, o garimpo do Juruena se tornou um dos maiores e mais antigos polos garimpeiros da Amazônia Mato-grossense.
O início do conflito com empresas mineradoras, começou em meados da década de 1980, quando a empresa Jaruana Mineração, Indústria e Comércio S/A, obteve junto ao DNPM (hoje ANM), 15 mil hectares, recobrindo lavras já descobertas e em plena atividade pelos garimpeiros.
Dr. João observa que o “marco deste conflito entre os garimpeiros do Juruena com a mineradora Jaruana, se deu no ano de 1987, quando a empresa tentou expulsar os garimpeiros, com a tese de que detinha os direitos de exploração do subsolo. O conflito resultou em mortes de ambos os lados, evidenciando a intensa disputa pelo território.
Os garimpeiros trabalharam de forma um pouco mais tranquila, por um período de 23 anos, até que a reserva do Juruena fosse extinta em 2011, por Portaria do DNPM, no Diário Oficial da União de 25 de fevereiro de 2011.
Essa medida extinguiu as reservas garimpeiras do norte do Mato Grosso, deixando dezenas de garimpeiros e suas famílias em situação de vulnerabilidade e insegurança jurídica, apesar de décadas de ocupação e exploração na região.
O geólogo observa que “nos processos que tramitam na ANM sobre o garimpo do Juruena, nota-se que o subsolo da região garimpeira, há 45 anos, vem passando sucessões comercial interminável de empresas, que perpetuaram um ciclo especulativo, assemelhando-se a uma pirâmide financeira”.
Conforme ele, as ações que a METAMAT desenvolveu no Juruena, a partir do ano de 2019, foram no sentido de se promover a organização da comunidade tradicional em uma cooperativa de garimpeiros (COOGAVEJA), para regularização e equacionamento do conflito do garimpo com mineradoras canadenses e australianas.
Esse processo é caracterizado pela constante troca de titularidade dos direitos minerários. No entanto, os garimpeiros do Juruena, organizados e representados pela COOGAVEJA, avançaram um entendimento com a empresa Keystone Mineração, em 2023, com assinatura de um Termo de Conciliação.
A problemática agravou-se quando uma nova Guia de Utilização, prevendo uma lavra com métodos distintos do que foi acordado, tendo os limites ampliados (2.386,97 hectares), extrapolando em muito os 86,5 hectares acordados. Inclusive recobrindo a área da vila onde reside a maioria das famílias de garimpeiros.
Para agravar ainda mais a situação, a ANM-MT emitiu, em 18/12/2024, os Laudos Técnicos nos processos de titularidade da Keystone, autorizando a implementação de uma servidão de 2.386,97 hectares, abrangendo propriedades de nove garimpeiros cooperados da COOGAVEJA e outros terceiros.
Neste sentido, não existe outra solução para este conflito que não seja a ANM assegurar os direitos dos garimpeiros, conforme estabelece a constituição, criando de novo a reserva garimpeira do Juruena, pondo fim a este martírio de 45 anos.
Além dos direitos inerentes ao subsolo, é patente, os direitos da comunidade garimpeira e dos moradores da vila sobre o solo. Por décadas, gerações de famílias construíram suas casas, criaram seus filhos, preservando sua cultura e fazendo parte da história deste Estado. Urge, portanto, um projeto de regularização fundiária.
Foto/ reprodução Keystone

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