José Vieira do Nascimento
Há poucos dias encontrei um conhecido. Não o via há algum tempo. Eu ia entrando em um determinado comércio e ele, alegre, com um ar de suprema felicidade, abria a porta, entrando no carro, assobiando e cantando uma música. Parecia muito alegre: “...Canta canta, minha gente, Deixa a tristeza pra lá. Canta forte, canta alto, que a vida vai melhorar...”.
Me Chamou muito a atenção. Não é comum nos tempos atuais ver alguém assim, tão feliz. Alegre, ele externava a mensagem otimista da canção do mestre Martinho da Vila, sem se incomodar com o que pudesse pensar quem passava na rua naquele momento.
Acenei com a mão, ele responde chamando-me. Aproximei para cumprimentá-lo. Então disse-me que queria se despedir. Iria estar fora da cidade por tempo indeterminado, viajando sem data para voltar.
-Bacana – disse-lhe. - Fico feliz por você e agora entendo porque está tão contente- completei.
Contou-me que a esposa quis separar-se. Ele concordou. De quebra, terminou com a amante e iria para Goiânia se encontrar com uma paquera do tempo de juventude, que reencontrou pela internet nas redes sociais.
Como ela também está solteira, viajarão juntos. Seu primeiro destino é o Chile, conhecer a Cordilheira dos Andes e também a região da Patagônia. Depois retorna para Salvador e embarca num návio para a Europa.
Falava sem parar. Disse que decidiu fazer uma opção por viver. Eu apenas assentia, confuso diante daquele homem, que ao mesmo tempo que transcendia contentamento, parecia estar jogando tudo para o alto, virando a página de forma brusca e mergulhando de cabeça numa sinuosa aventura.
- Não vai esperar para votar? – perguntei. - Que se f. a eleição! Se ninguém se importa com a cidade, porque eu vou me importar? – respondeu.
Há um enorme conflito que confunde os justos diante de suas responsabilidades, da abnegação de justiça social
Concluindo nosso diálogo em que me limitei apenas a ouvir, respondendo com monossílabos, antes de entrar no carro, ergueu o braço e com exceção do dedo maior da mão direita que ficou ereto, encolheu os demais e fez aquele gesto que você faz quando quer que “tudo mais vá pro inferno: - fds! Exclamou e foi-se embora.
-Boa viagem! - Desejei.
Fiquei vários dias pensando naquela conversa, que durou apenas cerca de 5 minutos. Que coragem e ousadia teve este cara de jogar tudo para o alto e ir passear! Pensei. E confesso que não deixei de admirá-lo por esta atitude.
Quantas vezes na vida também sentimos vontade de dar um Grande fds para o mundo!
Mas, convenhamos, não é tão simples assim. Talvez até por covardia, por valores e princípios, ou mesmo por ausência de coragem para menear um giro de 360 graus em volta de você mesmo... Se torna difícil se desvencilhar de tudo, assim de repente.
Entretanto, se um homem rico com uma enorme lista de atribuições, resolve em um dado memento da vida, dar um sonoro grito de liberdade, sem se importar com o status quo, deduzo que pelo menos um ‘Fd-(se)zinho’ todos nós, até para sair da pasmaceira do marasmo cotidiano, poderemos dar! Repensar a atitude diante da vida e se reposicionar diante de certos temas.
Porém,
do “não se importar por que não é comigo”.
Receio de confundir ousadia com egoísmo.
Entretanto, enquanto você sonha com uma cidade bonita, bem cuidada, com qualidade na Educação para ampliar as oportunidades à nossas crianças, atendimento aos invisibilizados, a realidade é a corrupção: emendas pix, desvios, superfaturamento, esquemas...
Mais cômodo é mesmo não se importar! Fazer como a maioria, que pensa apenas em si. Olvidar... Ignorar.
Deixar que os corruptos permaneçam chafurdando como porcos, se lambuzando na lama fétida que dissemina proveniente da miséria humana.
Afinal, se ninguém se importa, por que você tem que se importar?