por Geraldo Bessa TV Press
Criador de produções premiadas para o cinema e para a tevê, como o longa “O Homem que Copiava” e a série “Doce de Mãe”, a obra de Jorge Furtado tem muitas pitadas de humor. Disposto a tirar novos risos do público, ele volta ao ar ao lado de Regina Casé na concepção de “Tô Nessa”, sitcom dominical que ele mesmo acredita ser um dos trabalhos mais experimentais de sua carreira. Ali ele reúne público, cenário circular, banda e história pautada em personagens femininas. A cada semana, a série mostra as aventuras de Mirinda, papel de Casé, suas três filhas e neta, para cumprir alguma meta financeira. “Desde que a tevê existe, as sitcoms são uma lente de aumento em histórias familiares, era a que eu assistia na sala de casa com meus pais e depois com meus filhos. O ‘Tô Nessa’ é uma reunião de referências e técnicas que retrata uma família aos olhos de hoje”, conceitua.
Gaúcho de Porto Alegre, Furtado é fundador da prestigiada Casa de Cinema de Porto Alegre, uma das principais produtoras audiovisuais do país. No início dos anos 1990, estreou na tevê como roteirista da minissérie “Agosto”, baseada na obra de Rubem Fonseca, e emendou trabalhos de destaque como “Memorial de Maria Moura” e “A Comédia da Vida Privada”. Mais recentemente, fez parte da criação de produções de sucesso como “Mister Brau”, “Sob Pressão” e “Doce de Mãe”, série que faturou o Emmy Internacional da categoria comédia. Mesmo com esse currículo, Furtado confessa uma certa ansiedade em ver como o “Tô Nessa!” se desenvolve em uma das faixas de horário mais complexas da Globo, o chamado pós-Fantástico. “Vamos aprendendo enquanto fazemos. Esse risco de experimentar está motivando muito a equipe. Estamos empolgados em saber o que vai acontecer. Nas primeiras gravações já percebemos que temos um bom produto em mãos, espero que essa impressão chegue ao público também”, torce.
P – Você e a Regina Casé trabalharam juntos no início dos anos 1990, no “Programa Legal”. Como é a retomada desta parceria?
R – Veio da vontade de fazer humor juntos. Regina não fazia comédia rasgada desde a “TV Pirata”, há mais de 30 anos. Trabalhamos no roteiro do “Programa Legal”, mas a gente se conhece desde os anos 1970, época em que ela fazia parte do grupo teatral Asdrúbal Trouxe o Trombone. Ela é uma brilhante atriz de comédia. Está sendo bom tê-la de volta no gênero, ainda mais em um programa com plateia.
P – O que a plateia agrega a este projeto?
R – A riqueza vem da interação da Regina com o público. Ela é uma das pessoas no Brasil com maior poder de comunicação e interação com o povo, de falar com uma pessoa e se interessar pelo que ela tem a dizer, conversar e tirar histórias curiosas. A persona da Regina sempre teve esse viés jornalístico, de realmente se interessar pelo outro. É por isso que, por muito tempo, ela se dedicou mais para o seu lado apresentadora.
P – O tema dinheiro é retratado em muitos trabalhos seus, como os longas “O Homem que Copiava” e “Saneamento Básico – O Filme”. “Tô Nessa!” tem como fio condutor as metas financeiras da família protagonista. O que o motiva a falar sobre finanças?
R – Não sei bem o porquê, mas a dramaturgia tem um certo pudor ou tabu de falar em dinheiro. As pessoas nas novelas, nas séries, nunca dizem qual seu salário, ou quanto ganham por um trabalho, quanto custam as coisas. Mas a vida real das pessoas é totalmente baseada no dinheiro, estamos o tempo todo lidando com isso, falando sobre isso e pagando boletos. O dinheiro é fundamental na vida diária e uma fonte de inspiração para boas histórias.
P – Outro tema recorrente em “Tô Nessa!” são as tendências tecnológicas. É uma forma de atrair um público mais jovem?
R – Também, mas acontece de forma muito natural e criativa. Além dos roteiristas, a gente pega muita coisa nos ensaios, nas leituras dos próprios atores, porque eles também têm vivência. A Valentina Bandeira, por exemplo, além de atriz é uma influenciadora. O Dan Mendes, que é de Duque de Caxias como as personagens, também faz sucesso nas redes sociais e trouxe contribuições para o texto. A gente precisa fazer o possível para ligar a dramaturgia com essas situações da internet, o fato de todo mundo estar sempre online muda o jeito de criar.
P – Em que sentido?
R – A gente precisa retratar a rapidez do cotidiano. Hoje, todo mundo tem uma câmera e uma televisão no bolso. Então, isso muda a dramaturgia. Por exemplo, tem uma cena em que a Mari (Luana Martau) entra em casa dizendo: “mãe, você colocou o quarto para alugar?”. Ela soube disso pelo grupo de mensagens da família. Além disso, as três filhas vivem alertando a mãe sobre um possível cancelamento, caso ela continue a falar algumas coisas que estão desatualizadas ou não pegam bem de dizer hoje em dia.
“Tô Nessa” – Globo – Domingos, às 23h15.